O Egito numa encruzilhada
A resposta, no entanto, é muito clara, tão clara quanto o brilho do sol nos desertos egípcios: o Egito após o 25 de janeiro de 2011 não é mais o mesmo e quem teve o privilégio de, como eu, ir à praça Tahrir por duas vezes, até dois dias antes do primeiro turno das eleições presidenciais e conversar com aqueles que lá estavam de plantão, passou a ter certeza que uma volta ao antigo regime não é tolerada pelo povo egípcio.
Os militares do CSFA até tentaram e lutaram por isto de diversas maneiras: mandando aceitar candidatos inaceitáveis e não aceitar candidatos aceitáveis, trocar ministros e ordenar a dissolução do Parlamento e tudo o mais, mas o povo, na voz do presidente eleito do legislativo e membro da direção da Irmandade, foi lá e comunicou ao sub-chefe do CSFA, General Sami Annan, e outros militares presentes à reunião, a rejeição da emenda constitucional pela qual o CSFA retoma o poder legislativo. Informou também que o Parlamento se reuniria naquele mesmo dia, como Assembleia do Povo, e retomaria suas atividades.
Nem foi necessário o confronto; os militares já sabiam disto, desde o primeiro dia do levante, que o povo não admitiria “meia-volta-volver”! O povo egípcio, de seu lado, sabe que ganhar as eleições é apenas uma etapa e que o caminho a percorrer até a realização de sua vontade é longo e pedregoso. É o que anunciava a espera, sob o sol ardente do Egito inteiro, minuto e minuto, a declaração dos resultados das eleições no segundo turno.
De nada adiantou o recurso do General Ahmad Chafic ou os rumores e desinformações da mídia que continua nas mãos daqueles mesmos que a dirigiam durante o antigo regime de que a Irmandade havia manipulado as urnas, que Mursi havia perdido e sua organização estava preparando uma insurreição armada. O General era a última esperança para aqueles que queriam manter o poder que Hosni Mubarak lhes havia permitido, mas a vontade do povo foi mais forte.
O Marechal Tantawi deve ter pensado no que viu quando voltou de sua visita ao Pentágono, em Washington, um dia após o início da revolta e também tudo o que veio acontecendo desde então e como militar que quer guardar algum poder, ordenou a capitulação.
O povo egípcio, no entanto, deve ficar atento, pois Chafic e sua claque de homens de negócios e militares continuarão a fazer de tudo para recuperar seus antigos privilégios e lucros às custas da fome do povo egípcio.
Abre-se agora uma nova etapa, o primeiro presidente civil eleito tomou posse no dia 24 de junho de 2012 e pediu demissão da Irmandade Muçulmana e do Partido da Liberdade e da Justiça, confirmando que governará como presidente de todos os egípcios.
Nas ruas do Cairo e de todas as cidades egípcias basta ouvir o povo e constatar que cada um entendeu o significado de tomar o caminho após passar por esta encruzilhada. É uma alegria constatar que as vozes mais ouvidas são as dos jovens e que o Egito inteiro se transformou numa praça Tahrir, conscientes de que a hora da Ditadura e da subserviência aos interesses estrangeiros passou.
Não importa que a vantagem do presidente eleito tenha sido de apenas um milhão, pois o resultado significou uma vitória do povo que anseia por mudança, mãos limpas e sem trabalho, pobre mas honrado, contra toda a força do regime da corrupção e do entreguismo. É por esta razão que a vitória representou muito mais que um milhão a mais de vozes, é a esperança num futuro melhor.