Sírios representam 35% dos mais de cinco mil refugiados reconhecidos no Brasil, segundo professora da UEPB

Qui, 29/11/2018 - 22:51

Por Suely Melo

Dos mais de 22 milhões de refugiados no mundo, mais de cinco milhões vieram da Síria. No Brasil, eles são 35% dos mais de cinco mil refugiados reconhecidos no país, conforme a Convenção de 1951 e a Lei 9474/1997. Quem explica é a advogada, socióloga e professora adjunta do Curso de Relações Internacionais na Universidade Estadual da Paraíba – UEPB, Andrea Pacheco.

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A advogada Andrea Pacheco

Ela foi uma das palestrantes do I Congresso Internacional de Direito, Economia, Educação e Geopolítica - Refugiados, Transformações Globais, que aconteceu em Fortaleza, no Ceará, de 12 a 14 de novembro, organizado pela fotógrafa e estudante de Relações Internacionais Karine Garcêz. O evento discutiu a quantidade crescente de refugiados no cenário internacional.

“Esse alto número de refugiados sírios se explica pela crise humanitária existente no país, que faz com que a Síria seja atualmente o país com maior envio de refugiados no mundo”, frisa a especialista, que criou e coordena o Núcleo de Estudo e Pesquisa sobre Deslocados Ambientais (NEPDA) da UEPB, além de co-coordenar a Cátedra Sérgio Vieira de Mello na Instituição. No Brasil, afirma Andrea, “os sírios chegam, muitas vezes, solicitando refúgio com base no princípio jurídico nacional e internacional de reunificação familiar, pois há uma grande quantidade de sírios e descendentes que aqui residem”.

 

Refúgio no Brasil

A professora lembra que o Brasil recebe refugiados desde o final da Segunda Guerra Mundial, tanto como resultado de escritórios instalados pelo Governo brasileiro na Europa para rastreá-los e reassentá-los no país, como também em virtude do trabalho religioso realizado pelas Cáritas. “Contudo, a lei brasileira de proteção a esta categoria de pessoas vulneráveis foi criada apenas em 1997 (Lei 9474). Esta lei é reconhecida como uma das mais completas do mundo, no sentido protetivo de direitos, com criação do Comitê Nacional de Refugiados (CONARE) e ampliando a definição de refúgio da Convenção de 1951, ou seja, também reconhecendo como refugiado aquele que está fora de seu país, em virtude de grave e generalizada violação de Direitos Humanos”, destaca.

Ainda, segundo Andrea, o governo brasileiro baseia sua proteção aos refugiados em um sistema tripartite, formado pelo Governo, pela Cáritas (i.e. Sociedade civil) e pelo ACNUR (agência da ONU para Refugiados, i.e. sistema ONU). “A implementação de normas positivamente reconhecidas não implica, no entanto, em criação e implementação de políticas públicas padronizadas e eficazes no país, levando os refugiados que aqui chegam a episódios de violência, xenofobia, discriminação e preconceitos, apesar dos direitos garantidos pelo governo brasileiro, como acesso à educação, SUS, CTPS (i.e. relações de emprego) e segurança”,

 

Desafios

A especialista diz que o primeiro e básico desafio encontrado pelo refugiado ao chegar no Brasil é burocrático. “O procedimento da determinação da condição realizado pelo sistema tripartite acima citado, que se inicia na fronteira, particularmente pela falta de documentos comprobatórios e desconhecimento do idioma português”, ilustra. “Depois, há dificuldade de integração no mercado de trabalho, muitas vezes pelo idioma e também por preconceito e discriminação contra o estrangeiro”, enfatiza.

Andrea elenca outros desafios: “o acesso à educação, pois precisam trabalhar para manutenção; saúde, principalmente por não conhecerem o idioma local; habitação, pois não possuem condições financeiras nem conhecidos para auxiliarem no contrato de aluguel como fiadores, além da falta de conhecimento das normas pelos corretores e funcionários dos bancos”.

Significado do congresso sobre o tema para o Brasil

Andrea Pacheco ressalta que o congresso realizado em Fortaleza para debater a questão do refúgio foi de suma importância. “O Brasil ainda tem dificuldade de aplicar políticas ampliadas para recepção e acolhimento a refugiados e outros migrantes forçados, utilizando-se muitas vezes de precedentes, como a criação do visto por motivos humanitários para haitianos, sem haver contudo um regime padronizado”, comenta.

Ainda neste sentido, de acordo com ela, há também o regime de migração (Lei 13445/2017 c/c Decreto 9199/2017) e o de refugiados (Lei 9474/1997), que deveriam ser implementados de forma mais padronizada para auxiliar na proteção dos refugiados convencionais (baseados na Convenção de 1951) e outros migrantes forçados. “Assim, iniciativas acadêmicas são valiosas para conscientizar a população do dilema enfrentado por estes vulneráveis e da necessidade de protegê-los e inseri-los na sociedade local. Eles podem facilmente ser integrados, independentemente da bagagem cultural (i.e. idioma e religião) trazida por eles do país de origem”, completa a especialista.

Andrea Pacheco destaca, ainda, que o acolhimento aos refugiados em comunidade locais pode trazer desenvolvimento econômico, social, político entre outros ao país de acolhimento (ao governo, à sociedade local e aos próprios refugiados). “Eles produzem capital social - redes de confiança e cooperação - que leva ao desenvolvimento econômico, democracia e formação de recursos humanos e são capazes de serem e se sentirem úteis no local de acolhimento”, conclui.