Disputa irregular deve legitimar poder de Mubarak
No próximo dia 7, o Egito realizará sua primeira eleição presidencial disputada por mais de um candidato. Irregular, a corrida deve legitimar com ares "democráticos" a permanência do atual presidente. Na foto, Ayman Nour, um dos candidatos da oposição.Por Arturo Hartmann e Isabelle Somma No próximo dia 7 de setembro a população do Egito vai às urnas escolher seu presidente pela primeira vez através de uma eleição pluralista, com mais de um candidato. Até hoje, o país foi governado por líderes que não eram escolhidos por voto direto. Uma reforma política realizada em maio deste ano acabou com o sistema de referendo atual, utilizado desde 1981, no qual o candidato escolhido pelo Parlamento era aprovado no sistema de “sim” ou “não”. Um transcorrer irregular do processo político, no entanto, parece favorecer Mubarak a conquistar um quinto mandato. Dos candidatos que concorrem à eleição, apenas dois têm chance de conseguir uma votação significativa, Numan Gumaa, líder do partido Al-Wafd, e Ayman Nour, do partido Al-Gahd. Outros concorrentes, como os partidos Tagammu, de esquerda, e o Arab Nasiri preferiram boicotar a eleição alegando ser uma forma de protesto por causa da desigualdade de condições na disputa. Em um comunicado oficial do dia 19 de julho, o secretário-geral do partido Tagammu disse que “o governo mantém condições despóticas, se coloca contra qualquer reforma política e constitucional e insiste em não aceitar supervisão judicial (das eleições)”. Além dos partidos oficiais e reconhecidos, independentes que mantinham candidaturas simbólicas também decidiram desistir da campanha. O sociólogo Saadeddin Ibrahim e a escritora feminista Nawal el Saadawi, por exemplo, não poderiam concorrer porque a constituição eleitoral prevê condições estritas para candidatos sem partido. O partido Fraternidade Muçulmana, banido mas tolerado, diz que as restrições para os independentes são formas de parar o movimento, um dos mais fortes no país, na indicação de um candidato. O próprio Ayman Nour, candidato pelo Partido Ghad (Amanhã), foi preso sob falsa acusação de ter forjado assinaturas para se tornar apto a concorrer. Foi solto há alguns meses atrás, mas ainda será julgado. reclamações Uma das reclamações dos concorrentes de Mubarak é que a imprensa egípcia, em grande parte estatal, não fez uma cobertura que desse voz a todos os candidatos. Principalmente antes do início da campanha para a presidência, os concorrentes do atual governante não tiveram espaço, enquanto as aparições públicas de Mubarak eram positivamente noticiadas. O jornal estatal Al-Ahram, o mais lido do país e um dos maiores do Mundo Árabe, fez um especial em que intelectuais, artistas, personagens e religiosos elogiam os 24 anos de governo do presidente. Outra reclamação é a retirada de banners dos partidos por autoridades locais, que colocam no lugar propaganda do Partido Democrático Nacional, de Mubarak. Para a cientista política Hayat Alvi, apesar de manter uma aparência de regularidade nas eleições pluralistas, Mubarak manobra nos bastidores para garantir a vitória. “Ele colocou seu filho Gamal como líder do partido do governo, o Democrático Nacional. Ele prendeu candidatos oposicionistas e ativistas que lutam em favor da democracia, e ele lança suas forças de segurança brutais em manifestantes pacíficos. Além disso, a mídia egípcia é controlada pelo Estado”, disse Alvi ao Icarabe (veja mais da entrevista em “Eleições no Egito não passam de retórica de Bush e Mubarak, diz cientista política”). Para o mundo ver A eleição no Egito, diante das irregularidades pré e pós-campanha, seriam apenas um jogo de aparências para que os Estados Unidos possam fazer seu papel de defensor da democracia, o que justificaria as invasões do Afeganistão e do Iraque, e para que Mubarak continue no poder sob um processo “democrático”. A secretária de Estado dos EUA, Condolezza Rice, visitou o Egito em junho e pediu que a eleição e as reformas fossem levadas adiante, mas elogiou o papel de Mubarak no processo. Alvi eplica que “para manter uma imagem positiva da administração Bush, após as campanhas no Afeganistão e no Iraque, que resultaram em duras críticas contra a intervenção nesses países, os oficiais do governo americano começaram a criticar as políticas de Mubarak. E também começaram a pressioná-lo a liberalizar o sistema político e incorporar processos democráticos. Mas isso só foi feito para manter consistente sua imagem de promovedor da democracia. Nunca significou de nenhuma maneira ameaçar derrubar Mubarak ou intervir no Egito”.