Os árabes e a paz na Palestina
Em reunião do Conselho da Força Tarefa sobre Relações Exteriores, em setembro de 2003, foi consenso entre os participantes de “que existe pouca dúvida de que o estereótipo dos estadunidenses como arrogantes, auto-indulgentes, hipócritas, desatenciosos e que recusam ou não são capazes de diálogos interculturais é chocante e profundamente enraizado”. A unanimidade deste órgão de assessoria presidencial, nos Estados Unidos da América, foi uma das raríssimas vezes nas quais houve acordo entre árabes e norte-americanos. A maioria dos árabes, então e agora, estão bastante conscientes da urgência dos problemas que tem o mundo árabe. A política norte-americana deveria refletir a consciência disto, mas não é o que ocorre. Não se trata de amor ou desamor à bandeira de listas e estrelas e sim do quanto esta ignorância, vindo de um país que ocupa terras árabes, com base em mentiras e encoraja outras aves de arribação a perpetuarem a ocupação de terras árabes fecha as portas para uma solução dos problemas árabes. Engana-se quem pensa que os Estados Unidos direcionam as suas próprias e as políticas e atitudes de Israel, pois a verdade é exatamente o contrário. O antigo sub-Secretário de Estado George W. Ball (nos governos Kennedy e Johnson) observa em suas memórias: “Em matéria de política para o Oriente Médio, o Congresso se comporta como um grupo de poodles treinados, pulando através do aro segurado pelo lobby de Israel”. O mesmo ocorre no poder executivo, como observa Donald F. McHenry, representante permanente dos Estados Unidos nas Nações Unidas (sob o governo Carter) e presentemente professor de diplomacia e relações exteriores da Georgetown University: “Por causa da influência do lobby israelense, nosso governo está impossibilitado de perseguir seus próprios interesses nacionais no Oriente Médio”. A pergunta então é porque todo este alvoroço, agora, tanto dos Estados Unidos quanto de Israel para resolver os problemas da Palestina; se é que são os problemas da Palestina! Em troca da paz, há mais de um quarto de século, em 1981 foi elaborado pela Arábia Saudita o “Plano Fahd” o qual, apresentado e aprovado por unanimidade pela XII Cúpula Árabe, reunida em Fez, no Marrocos, foi apresentado às Nações Unidas, prevendo: 1. A retirada de Israel de todos os territórios ocupados por ele em 1967, incluindo a Jerusalém árabe; 2. O desmantelamento dos assentamentos estabelecidos por Israel em territórios árabes desde 1967; 3. A garantia da liberdade de culto e cumprimento de rituais religiosos para todas as religiões nos Lugares Sagrados; 4. A reafirmação do direito do povo palestino à autodeterminação e do exercício de seus inalienáveis e imprescritíveis direitos nacionais, sob a liderança da Organização de Libertação da Palestina, seu único e legítimo representante e a indenização aos que não desejarem retornar; 5. A colocação da Margem Oriental e da Faixa de Gaza sob a supervisão das nações Unidas por um período de transição não excedendo poucos meses; 6. O estabelecimento de um Estado independente da Palestina tendo Jerusalém como sua capital; 7. O estabelecimento pelo Conselho de Segurança das Nações Unidas de garantias de paz entre todos os Estados da região, incluindo o Estado independente da Palestina; 8. A garantia pelo Conselho de Segurança da implementação destes princípios. No entanto, independente de quem é a cabeça da serpente: Estados Unidos e Israel desdenharam a oferta árabe. Na reunião de cúpula árabe, realizada em 2002, em Beirute, no Líbano, a Arábia Saudita adaptou o “Plano Fahd” e o então Príncipe e hoje Rei Abdullah Ibn Saud, apresentou o que passou a se chamar “Iniciativa Árabe de Paz” representando um gigantesco passo em direção à paz e, diferente da proposta de 1982, propôs, sem sobra de dúvida a normalização das relações com Israel, referindo-se igualmente ao retorno dos refugiados palestinos, no que parece mais uma moeda de troca. Israel ignorou e os Estados Unidos idem. Agora, após a derrota de Israel na tentativa de invasão do Líbano, no verão de 2006, e a derrocada dos Estados Unidos no atoleiro iraquiano, viraram tutti buona gente! A afobação é tamanha que enquanto George W. Bush, Presidente dos Estados Unidos, despacha seus representantes ao Oriente Médio, para que proponham a paz, vendendo bilhões de dólares em armas e munições, toma, ele próprio, a iniciativa nada apressada de convocar uma reunião, para o próximo outono, daqui a alguns meses, destinada a promover a paz árabe-israelense. Se tardia é a reunião, não é cedo para que comece a pensar que esta é uma oportunidade única para mudar e não simplesmente praticar um outro embuste. Os árabes já fizeram propostas sérias e irrecusáveis, por duas vezes, por iniciativa saudita, no entanto, as expectativas não são nada animadoras para esta reunião cujos participantes e cuja agenda não está clara. A reunião pode ser vista como mais um marco num longo caminho cheio de decepções e iniciativas falhas de paz. Do ponto de vista político, Bush está com a corda no pescoço, devido aos problemas iraquianos e outros e quer faturar uma vitória, em algum lugar, para não apear do cavalo do poder como um derrotado, alquebrado e desacreditado cowboy. A paz árabe-israelense é um pântano no qual dificilmente um presidente estadunidense poderá fincar uma bandeira vitoriosa, pois, como foi lembrado acima, os sentimentos e forças pró-Israel estão à espreita em Washington. De seu lado, o Oriente Médio clama por progresso neste sentido, assim como o próprio povo norte-americano. O Mundo Árabe fez a sua parte e adaptou a “Iniciativa Árabe da Paz” demonstrando sua intenção de negociar a paz de forma permanente baseada nas resoluções das Nações Unidas e em compromissos razoáveis. Estados Unidos e Israel precisam fazer um gesto recíproco agora, para que a reunião do outono produza frutos.