Prezados Amigos
No dia 28 de agosto, a Folha de S. Paulo publicou entrevista com a jornalista espanhola Pilar Rahola, segundo o jornal, uma “especialista em terrorismo”. Especialista no assunto, falhou ao olhar para uma cultura muito mais complexa. Suas respostas foram um desfile de conceitos lamentáveis e racistas que consolidaram mais uma vez um preconceito arraigado à cultura árabe. Os árabes, desde a sua expulsão da península Ibérica, têm sido acusados de atos que não cometeram, como também lhes é negado seu papel civilizatório. Dentre outras coisas, o pensamento árabe exerceu influência no que viria a ser considerada a revolução de pensamento conhecida como Renascimento. De forma deliberada e confusa, na entrevista, a jornalista compara o islamismo com nazismo e depois se refere a um 'fascismo árabe' sem nenhuma contextualização histórica. Suas afirmações terminam por inferir e generalizar que ser islâmico é ser árabe e ser árabe é sinônimo de terrorismo. A jornalista termina acusando islâmicos e árabes pelo terrorismo que se espalhou no mundo, o que termina por estimular uma forma de anti-semitismo e termina gerando injustos preconceitos em relação aos muçulmanos, sejam eles árabes ou não, e aos árabes, sejam eles muçulmanos ou não. Já estamos acostumados, mas não tolerantes, com a enxurrada de bobagens desse tipo, que procuram fortalecer preconceitos através do incentivo da ignorância e desencorajam um olhar ao outro de maneira respeitosa e igual. Essas opiniões, emitidas por “especialistas” e reproduzidas sem senso crítico ou igualdade de voz pela imprensa em geral, exige de nós uma postura não-agressiva, distinta do que provavelmente se espera numa relação demonizada como esta que estão orquestrando. A agressão não é instrumento de persuasão, pois ela incita um confronto que justificaria os absurdos emitidos pelos autores e “especialistas” dos textos apresentados. Precisamos, portanto, reconhecer os becos sem saída a que vão nos tentar conduzir, nós, da comunidade árabe. A estratégia de repúdio, a ser seguida - e que não deve guardar sigilo algum, pelo contrário, deve ser absolutamente visível, transparente e eloqüente -, é esclarecer, de forma constante e sistemática, os erros e preconceitos cultivados e despejados no interior da sociedade. Em primeiro, é ignorância e um tremendo descuido científico acusar os árabes de anti-semitas, pois os árabes também compõem aquilo que se convencionou chamar de povos semíticos, originados das civilizações antigas que habitavam a região da Mesopotâmia. Segundo erro: não se deve confundir o anti-sionismo que os árabes nutrem diante da injustiça da Palestina como expressão de anti-semitismo. Isso por si é incoerente no seu aspecto histórico, pois a aversão ao sionismo não se dá por motivos étnicos ou religiosos, mas por um aspecto político-militar. A analogia e comparação da jornalista só interessam à contra-informação condenável dessa forma de defesa do sionismo. Quanto às opiniões e visões de mundo grosseiras e simplificadoras da “especialista” quanto ao Islã, é preciso lembrar que todas as religiões - não só o islamismo, e também qualquer outra estrutura de organização social - , não estão isentas de conflitos e contradições internas. De tal forma que a comunidade islâmica tem no seu interior grupos minoritários, radicais e extremamente ativos que usam bandeiras e palavras de ordem historicamente presentes no imaginário da população, por isso difíceis de combater internamente. No entanto, uma parte não pode ser tomada como voz absoluta de toda a comunidade. O Islã sempre buscou os caminhos da justiça e da liberdade, e se expandiu dessa maneira como no caso da península Ibérica, onde judeus e cristãos não foram obrigados a abandonar os seus credos, culturas e línguas faladas. Somos totalmente favoráveis à discussão e informação nesses temas delicados e polêmicos, mas elas devem ocorrer num ambiente de debate ético, e sobretudo, com mais clareza sobre aquilo a que se está referindo.