Nasci e cresci nos fundos da loja de meu pai, na Rua Bernardino de Campos, carregando um sobrenome armênio difícil, cheio de consoantes. A inocência da infância e o silêncio da família tardaram a descoberta que os armênios estavam aqui por um acaso, um descuido do destino. Descobri que meu pai Aris era órfão após toda a família ser morta por afogamento, que meu tio Arthur Yacubian também era órfão, que minha tia-avó Flora Kuyumjian teve seus três filhos pequenos assassinados na sua frente, e assim por diante, numa sina de histórias trágicas em todas as famílias. Por que me esconderam? “Era para ser esquecido”, diz minha mãe Parouhi. “Seu pai não gosta de conversar sobre isso”. Eu precisava de respostas. Em 1981, ao término do ano letivo na Inglaterra, visitei a Armênia ainda soviética, em busca de raízes. Foi a minha “Passagem para Ararat”, em referência ao livro de Michael J. Arlen, que descobre tarde as raízes de seu pai, famoso romancista anglo-armênio, Dikran Kouyoumdjian, que mudou o nome e tentava esquecer a Armênia. Trata do que significa ser um armênio ou descendente de um povo orgulhoso, que por séculos conquistadores tentaram exterminar. Henri Verneuil, famoso cineasta francês, nascido Achod Malakian, cresceu em uma família de refugiados armênios. Ele escreveu “Mayrig” e depois o dirigiu em filme. Nas suas memórias, diz: “Mais do que orgulho, o que sinto é a felicidade de ser armênio. O que é diferente. Trata-se de um sentimento mais profundo, mais sereno, mais refletido, mais durável... Creio que o essencial para os armênios da diáspora é guardar indelével a memória de sua origem, conhecer bem a grande civilização da qual descendem e, ao mesmo tempo, afirmar-se como cidadão do país em que vivem. Em suma, ser dois personagens em um só, duplamente enriquecido porque vivendo em duas culturas, as raízes numa e os galhos noutra”.
24 de abril simboliza o Genocídio Armênio. Neste dia, em 1915, o governo turco-otomano prendeu e executou centenas de intelectuais armênios. Depois, famílias foram arrancadas das casas e deportadas em caravanas da morte pelo deserto da Mesopotâmia, sem comida ou água. Toda sorte de atrocidade foi cometida e o povo quase foi varrido da terra com 1,5 milhões de mortos. Os armênios aguardam o reconhecimento do genocídio, sistematicamente negado pela Turquia. É inadmissível que nos dias de hoje, depois de quase um século dos trágicos acontecimentos, a história continue sendo rasgada. Faço aqui minha homenagem às bravas famílias armênias que se estabeleceram em Rio Preto desde 1930:
Casa Parsek (Parsekian), Casa Verde (Kouyoumdjian), Casa Real (Nuri e Nichan Kuyumjian), Casa Centenário (Terzian), Casa Sumaré (Topdjian), Casa Garabed (Karabachian), Casa Zerunian (Zerunian), Casa Combate (Manughian), Casa Valter (Vartanian), Casa Paratodos (Missak Yacubian), Casa Moderna (Sarian), Casa Violeta (Partamian), Casa Globo (Minás Kuyumjian), Casa Armênia (Kholasarian), Casa Rosa (Minassian), Casa Ideal (Kheugherian, Rio Preto), Casa Ideal (Darakjian, Mirassol), Casa Arthur (Arthur Yacubian, Mirassol), Floricultura Tony (Jalikjian), Cirandinha Calçados (Janikian) e Peixaria do Mercado (Yervant Yacubian).
Prof. Dr. Joao Aris Kouyoumdjian é professor-adjunto de Neurologia da Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto (Famerp).
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