Manter a identidade palestina torna-se desafio das comunidades na diáspora
Com um importante papel na luta pela causa, as comunidades que vivem fora dos territórios enfrentam agora o desafio de manter entre os descendentes o pertencimento à identidade palestinaA Palestina livre e independente não existe. Os territórios que são, no papel, oficialmente palestinos, decisão reiterada por resoluções da ONU, estão ocupados ou cercados. Os palestinos não dispõem das decisões para controlar seu próprio destino ou para montar uma infra-estrutura palestina de sociedade. Seu cotidiano está controlado, militarmente e burocraticamente, por Israel. Desde 1948, os palestinos viram diversas etapas do conflito com os israelenses. Jamais alguma delas, principalmente Oslo - que foi o mais próximo que se chegou de um Estado soberano - os colocou perto de uma solução que lhes fosse digna. Agora, os quase 60 anos da ocupação começam a pesar. O envelhecimento do conflito, que para os palestinos tinha como preocupação central o aspecto político, traz um novo problema: aos palestinos, continuarem palestinos. Para as comunidades na diáspora, que habitam outros solos, isso se torna, cada vez mais, um desafio. E o 9º Congresso das Comunidades Palestinas em Porto Alegre trouxe para a pauta essa discussão. Para Sami Eljundi, médico, da primeira geração nascida no Brasil, com as poucas possibilidades de o conflito ser resolvido em um horizonte próximo, o problema da manutenção da identidade torna-se essencial para a defesa da questão palestina. “O que estava na pauta há 30 anos era a defesa da causa. Passaram-se 30 anos, não há perspectiva de solução do conflito em curto prazo e a questão da identidade se tornou um problema. Não podemos mais defender só a causa. Temos que defender a identidade sob a pena de a causa morrer porque a identidade desapareceu. Precisamos construir atividades dentro das comunidades, para que nos preservem como palestinos. Quanto mais brasileiro-palestinos nós formos, menos palestinos nós seremos, e menos ainda serão nossos filhos e netos”. A Embaixadora da Palestina no Brasil, Mayada Bamie, também destacou a importância de passar aos jovens na diáspora não só as tradições e manifestações culturais palestinas, mas o sofrimento do povo sob ocupação. Fazer com que essas características não sejam esquecidas é um fracasso para as políticas israelenses que tentam minar a identidade palestina. “É bom poder ver a juventude que faz o folclore, a dabka, que canta. Isso é parte da cultura palestina. Esses moços e moças nasceram aqui, mas fico contente porque a cultura está sendo passada de geração para geração. Quando os líderes israelenses, em 48, nos expulsaram da Palestina, disseram: ‘Esta geração vai sofrer, a outra vai esquecer’. Depois de mais de 50 anos, estes que nasceram no Brasil não esqueceram. É muito importante a comunidade guardar a memória do povo”. Husam Bajis, palestino que vive em Chicago, Estados Unidos, acredita que o importante papel a ser desempenhado pelas comunidades na diáspora passa por um processo de autoconhecimento e reafirmação de quem são. Ele acredita que, ao se diferenciar das sociedades nas quais vivem, e posteriormente com a formação de organizações, como a Fepal (Federação das Entidades Palestinas) no caso brasileiro, os palestinos na diáspora podem criar canais de contato com o povo nos territórios. “Os palestinos vivendo fora devem se diferenciar de outras comunidades. Eles não podem ser um galho de uma árvore que pertence a uma outra comunidade. Uma vez que os palestinos possam se ver como únicos e diferentes, então poderão ajudar. A situação nos territórios palestinos, infelizmente, degradou a vida das populações que lá vivem. É uma vida muito dura e, portanto, eles precisam da força das comunidades vivendo fora.”. Para Husam, aberto este canal, os palestinos na diáspora começariam a entender as necessidades do povo sob ocupação. “Os palestinos na diáspora devem ser conscientes de que devem ajudar aqueles que muitas vezes não têm força e são humilhados diariamente. Na Faixa de Gaza, há a maior densidade no mundo per capita. A vida lá é muito difícil. Não têm, por exemplo, jardim para que suas crianças brinquem. Eles têm quatro, cinco, seis, às vezes até mais pessoas vivendo em apenas um quarto. Famílias estão vivendo uma em cima da outra. A demanda de água é grande, mas é controlada, e a educação, durante a Segunda Intifada, foi se degradando”.