População resiste sem violência ao cercamento da cidade
Para palestinos da Cisjordânia, não-violência é uma forma - ao contrário dos atentados, não noticiada – de demonstrar a imensa diferença de poder entre o quarto maior exército do mundo e população impedida de viver seu cotidiano.por Noura Khouri e Arlene Clemesha Entre 27 e 30 de dezembro de 2005, realizou-se em Belém, na Palestina, a conferência internacional “Celebrando a Não-Violência”. Durante quatro dias, discutiram-se métodos, técnicas e teorias de resistência não-violenta, com ênfase no potencial dessa forma de luta e sua utilização em movimentos de independência ao redor do mundo, do Tibet à Bósnia. Há décadas o povo palestino vem resistindo - através de manifestações pacíficas e outras formas de não-violência - à conquista de sua terra pela quarta potência militar do planeta. A simples realização da Conferência, nas atuais condições de violência e usurpação representados pela ocupação israelense, representa, em si, uma demonstração do nível de humanidade sustentado pelo povo palestino. Passando da teoria à prática, no último dia realizou-se uma vigília no Muro de Belém, enquanto outro grupo se deslocou ao vilarejo de Bil’in, perto de Ramallah, para apoiar a população, que há meses resiste com determinação e criatividade, à usurpação de suas terras para a expansão de assentamentos e a construção do Muro. Ao chegar em Bil’in – depois de horas em filas e postos de controle perfeitamente capazes de causar raiva e exasperação - o que vimos foi uma grande reunião de familiares e amigos, (além dos palestinos de cidades vizinhas e os chamados ‘internacionais’, dentre os quais estavam, nesse dia, os pais de Rachel Corrie*) com chá de menta no fogo e refeições ligeiras para as crianças. Os adultos revezavam no trabalho de afofar a terra ao pé das oliveiras. Enquanto isso, do outro lado de gigantescas pilhas de brita, encontravam-se exército e colonos israelenses operando retro-escavadeiras e caminhões na multiplicação de fileiras e mais fileiras dos monótonos edifícios de monobloco de um dos seis assentamentos de Modin Illit. O simbolismo da cena era imenso. E a mensagem, clara: os donos da terra de Bil’in não desistiriam de trabalhá-la e de lutar por ela, não obstante o tamanho do “monstro” que se erguia a duzentos metros de distância. Como dizia Mohammed Khatib, uma das lideranças do Comitê Popular de Bil’in contra o Muro, “nossa manifestação tem o objetivo de parar a destruição da nossa terra pelos buldozeres e enviar uma mensagem sobre o impacto do Muro. Chegamos a nos acorrentar a oliveiras, que estavam sendo arrancadas para dar lugar ao Muro, para mostrar que tirar a vida dessas árvores equivale a tirar a vida do vilarejo. Somos 1600 moradores e dependemos da colheita da oliva para sobreviver. O Muro nos priva de 60% de nossas terras e irá transformar Bil’in em uma prisão a céu aberto, como Gaza. Distribuímos cartas entre os soldados, pedindo que eles pensem antes de atirar contra nós, explicando que não somos contra o povo israelense, mas contra esse Muro que nos estrangula”. A política de expansão dos assentamentos e construção do Muro ao redor deles não termina em Modin Illit. De acordo com o relatório secreto da União Européia, “Israel planeja a construção de 3.500 novas residências para colonos na Margem Ocidental. A expansão do assentamento de Ma’aleh Adumin, a leste de Jerusalém, ameaça rodear completamente a cidade por assentamentos israelenses”, desconectando Jerusalém das vizinhas Ramallah e Belém, e eliminando a já parca contigüidade territorial entre o norte e o sul da Margem Ocidental (Cisjordânia). Sob o Mapa da Estrada, Israel comprometeu-se a paralisar toda construção de assentamentos; pela lei internacional, todos os assentamentos são ilegais; de acordo com a decisão da Corte Internacional de Justiça, o Muro deve ser derrubado. No entanto, em pouco tempo Israel terá terminado de construir o Muro, dividindo vilarejos ao meio, separando os trabalhadores das terras cultivadas e fontes de água, impedindo o acesso de pacientes aos serviços médico-hospitalares, alunos às escolas e universidades, e, finalmente, anexando praticamente 50% da Cisjordânia ao território nacional de Israel. O relatório da União Européia não deixa de mencionar as sérias conseqüências sociais e humanitárias já sentidas pelos palestinos. Enquanto eventuais homens-bomba fazem as manchetes por dias a fio, a resistência de Bil’in não ganha os noticiários, nem a expansão do assentamento de Ma’aleh Adumin em Jerusalém Leste, nem o término do Muro que agora rodeia e aprisiona os moradores de Belém, sequer a re-ocupação do norte da Faixa de Gaza (que, como um todo, ainda está sob controle israelense) em dezembro último para a construção de uma “zona de segurança” (em uma operação de evacuação seguida do bombardeio e destruição de residências e de três quilômetros quadrados de terras cultivadas, que contou com o ferimento de uma criança). Em Bil’in, vimos, mais uma vez, que os palestinos vão continuar resistindo à ocupação, à construção de assentamentos ilegais e do Muro mais horroroso que a humanidade já viu. Mas o que o mundo, cidadãos e governos vão fazer para pressionar Israel a parar mais esse desrespeito à lei internacional e aos mais básicos direitos humanos? Para assinar a petição contra o Muro de Bil’in, acesse http://www.petitiononline.com/Bilin/petition.html