Mulheres com véu questionam modelo ocidental, diz Plinio Freire

Seg, 25/07/2016 - 13:51
O público lotou o auditório da Livraria Martins Fontes, em São Paulo, na sexta-feira, dia 22, para assistir à palestra “O véu e o conflito da visibilidade”, com Plinio Freire, mestre em História pela FFLCH-USP. O encontro integra o Ciclo de Conversas sobre Cultura Árabe e Islâmica, parceria do ICArabe com a livraria.

“A gente (do ocidente) está no mundo da ostentação onde tem de se mostrar importante. São duas formas de visibilidade que juntas entram em curto-circuito”, afirmou Plinio sobre a utilização do adereço no oriente. “As mulheres (do mundo islâmico) quando se mostram veladas questionam o nosso modelo. Será que as mulheres denudadas estão livres mesmo?”, questionou.

O historiador refletiu sobre o mito de que o véu teria sido uma criação islâmica. “A arte greco-romana é sobrecarregada de figuras femininas veladas”, disse em relação a pinturas da cultura da qual o mundo ocidental é herdeiro. O uso do véu também é determinado pelo Novo Testamento da Bíblia cristã enquanto o Alcorão, por sua vez, coloca-o algumas vezes como recomendação.  “O Islã não institui nada, o véu já estava lá (nos costumes), inclusive no ocidente. Estranho seria o Islã dizer que a partir de hoje não poderia usar véu”, afirmou.

Outra concepção equivocada em relação ao véu consiste em chamá-lo de burca, quando este é apenas um dos cinco tipos: hijab, burka, niqab, shayla e chador. “A imensa maioria das mulheres muçulmanas utilizam o hijab, que cobre o cabelo e deixa o rosto a mostra”. Já o niqab, segundo Freire, deixa os olhos das mulheres à mostra, muitas vezes pintados. A shayla e o chador são de origem persa, usados muito no Irã, e a burka é o véu que cobre o corpo inteiro, utilizadas em regiões que não representam todo o mundo islâmico, segundo Freire. 

Orientalismo na arte

Plinio Freire também falou sobre o orientalismo na arte: a forma eurocêntrica como as mulheres do oriente eram representadas fora da realidade. “Essa moda que mostrava que a mulher oriental tinha predisposição à nudez”, disse em relação a pinturas da Era Moderna. “Tudo isso é o imaginário dos europeus, a fantasia dos homens que atravessaram o mediterrâneo e encontraram as mulheres veladas.”

De acordo com o historiador, há diferença na concepção de sensualidade nas culturas ocidental e oriental. “A gente não consegue ler mais os sinais eróticos, pois estamos saturados de pornografia”, afirma. O historiador declarou não entrar na questão da opressão da mulher na palestra, mas mostrar a concepção ocidental ao enxergar o uso do véu.

Para o documentarista Mauricio Yasbek, diretor do filme “Brimo”, exibido na Mostra Mundo Árabe de Cinema em 2015, que assistiu à palestra, a cultura oriental mostra uma percepção diferente da brasileira. “Quando vemos o véu, que preserva mais a personalidade daquela mulher do que o corpo e a sensualidade, podemos ver uma maneira diferente de interpretar a sensualidade. Traz de volta os gestos e a voz como se pudesse provocar outros encantos”, afirmou.

O estudante Pedro Mendes, 19, gostou do tema da palestra.  “Sou bastante interessado pela cultura árabe. Gostei bastante da quebra de tabus, há muitos elementos comuns entre as culturas ocidental e oriental. A xenofobia não tem fundamentos”, afirmou.

"A palestra sobre o véu e o conflito da visibilidade foi mais uma gratificante iniciativa do Icarabe dentro do ciclo de palestras em parceria com a Livraria Martins Fontes”, ressalta Natalia Nahas Carneiro Maia Calfat, diretora de Relações Interncionais do ICArabe. Para ela, o encontro foi importante não somente para esclarecer os diferentes usos do véu dentro da cultura islâmica mas, sobretudo, para resgatar nossas próprias tradições veladas dos períodos clássico e renascentista. "A análise das pinturas e obras orientalistas encerraram a palestra trabalhando problemáticas sobre o Oriente Médio e Mundo Muçulmano ainda hoje presentes em nosso imaginário."

O Ciclo tem coordenação de Heloisa Abreu Dib Julien, secretária geral do ICArabe, com apoio de Natalia Nahas Carneiro Maia Calfat e outras duas diretoras do Instituto: Jamile Abou Nouh e Yasmin Fahs.

Confira as próximas palestras:

02/08, terça-feira, das 19h30 às 21h30

Cinema Árabe na atualidade - Geraldo Adriano Godoy de Campos, curador da Mostra Mundo Árabe de Cinema

 

03/08, quarta-feira, das 19h30 às 21h30 

Desafios de correspondentes em zonas de guerra: coberturas no Oriente Médio – Samy Adghirni

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