Cenários cinematográficos árabe e brasileiro são tema de debate na 9ª Mostra Mundo Árabe de Cinema
Com moderação de Geraldo Adriano Godoy de Campos, diretor e curador da Mostra, o evento contou com a participação de Christian Mouroux (professor do curso de pós-graduação em História do Cinema Árabe da Universidade de Buenos Aires) e diretor artístico do Festival Internacional Latino-Árabe de Cinema, da CineFértil, e Alfredo Manevy, secretário adjunto da Secretaria Municipal de Cultura de São Paulo, doutor em Audiovisual pela Universidade de São Paulo e coordenador geral da SPCine.
Geraldo fez um balanço da 9ª Mostra Mundo Árabe de Cinema, que cresce anualmente e consolida-se no calendário cultural de São Paulo, trazendo a arte como possibilidade do diálogo. “Constatamos com alegria que ela apresentou um crescimento muito grande. Este ano são 27 filmes. Queremos aprofundar um pouco mais, na medida do possível, o debate, a problematização sobre as questões que os filmes trazem e sobre o próprio mundo árabe.”
Cinema do Mundo Árabe
Christian Mouroux abriu a discussão observando que estamos habituados a pensar o mundo árabe sob um ponto de vista unidimensional. Não existe, segundo ele, um cinema árabe, mas vários. “Cada país apresenta um universo em si mesmo para analisarmos.”
Mouroux comentou sobre a produção cinematográfica no mundo árabe, como a dos países do Golfo. Segundo ele, estão, em grande medida, impulsionando uma nova geração de cineastas árabes. “Estamos falando basicamente dos Emirados Árabes, Dubai, Abu Dhabi e Catar, que desde 2004 vêm gerando um verdadeiro boom cinematográfico e conseguiram instalar no cenário internacional seus próprios festivais”. Estes países, disse, fizeram seus próprios fundos de financiamentos e incrementaram exponencialmente e em muito pouco tempo sua produção cinematográfica. O convidado destacou também o Marrocos, afirmando que o país desenvolve um modelo de cinema mais similar ao da América do Sul, com forte participação estatal.
Christian falou ainda sobre a CineFértil, parceira do Instituto da Cultura Árabe na Mostra pelo segundo ano e que realiza em 2014 sua 4ª edição do Festival Internacional Latino-Árabe de Cinema, premiando anualmente filmes enviados de vários países árabes, além de projetos em desenvolvimento e outras iniciativas nos países latinos. “Produzimos para entender melhor o que está acontecendo à volta, para pensar em desenvolvimento, iniciativas e políticas que impulsionem outras iniciativas. Podemos fazer certas tentativas de integração ao menos em produções visuais, como Argentina e Brasil”. Segundo o acadêmico, as transformações sociais pelas quais o mundo está passando possibilitaram as coproduções e o espírito colaborativo.
A importância das parcerias
Em sua apresentação, Alfredo Manevy ressaltou a importância do apoio da Secretaria de Cultura à Mostra, que constrói a cada edição a sua história e já faz parte da agenda cultural da cidade de São Paulo. “Ao nos associarmos, abrimos a oportunidade de incorporar a discussão dos países árabes e seus cinemas na vida e na formação de cidadania que a cidade oferece pelo seu sistema educacional e cultural.”
Segundo ele, é preciso colocar essa discussão no circuito mais amplo pelos laços que São Paulo tem com o mundo árabe na formação de sua história. “Esta é uma oportunidade de celebramos esses vínculos e os discutirmos. Partimos dessas duas possibilidades e dessas duas perspectivas”.
Manevy levantou também a questão do contexto em que a Mostra é realizada, em meio aos acontecimentos em Gaza. A situação, disse ele, devido às circunstâncias, torna a mostra e essa discussão ainda mais relevante e mais estratégica para que todos os cidadãos possam se solidarizar. “A Mostra coincide com essa grande ferida aberta e isso para nós é uma oportunidade para que São Paulo faça essa discussão, que é política. A Mostra é uma janela aberta para a dimensão cultural do mundo árabe. Permite uma relação que é muito diferente, direta com as questões sociais, humanas e políticas”.
A Mostra, acredita, simboliza um espaço de reflexão crítica e fruição estética. Começo de uma política cultural. É importante, pontuou, que o cidadão do século 21 entenda o que é o mundo árabe, quais são as diferenças culturais do planeta e como é viver na diversidade. “Não é uma questão de cinema apenas ou cultura, mas uma questão de formação de uma consciência e de uma cidadania que são cada vez mais necessárias.”
Para Manevy, a ASPA (Cúpula América do Sul-Países Árabes), um mecanismo de cooperação inter-regional e um fórum de coordenação política que tem como objetivo aproximar as duas regiões que possuem afinidades políticas, econômicas e culturais, anda ainda a passos pequenos no caminho da cultura.
É necessário, segundo ele, usar o cinema como agenda estratégica de produção e codistribuição. O caminho que mostra uma possibilidade, afirmou, é começar pelo desenvolvimento de roteiro e pela pesquisa filosófica entre artistas e países em coprodução. “É necessária uma aproximação na área de cinema e TV que possam trabalhar os vínculos entre países. Na América do Sul e alguns países árabes há muitas histórias para serem contadas.”
Manevy acrescentou ainda que um dos focos da SPCine é estimular as coproduções com indústrias estratégicas na relação com o mundo árabe. Ele admite, no entanto, que não é fácil, mas se algo concreto não for feito esta relação ficará ainda distante. “É preciso induzir e acelerar esse processo, ampliar o link de integração. Há muita gente que tem interesse pela América do Sul, no Brasil, na Argentina, no mundo árabe, na África em geral. Não haverá integração política e econômica, se não houver integração cultural.”