Roberto Khatlab mostra em livro como Dom Pedro II aproximou o Brasil do Mundo Árabe
“O que Dom Pedro fez foi de uma forma indireta, não oficialmente. Aquele homem intelectual e simples falando do Brasil atraiu os governos. Ele mudou aquela visão ruim do Brasil”, contou Khatlab.
Paranaense nascido na cidade de Maringá, Khatlab é ganhador do prêmio libanês de literatura Said Akl e no país árabe é atualmente diretor do Centro de Estudos e Culturas da América Latina da Universidade Saint-Esprit de Kaslik (Cecal-Usek). Ele é autor de vários livros publicados sobre história, religião, relação Brasil-Oriente Médio e imigração, nos idiomas português, árabe, francês e espanhol.
A ideia de escrever sobre D.Pedro II surgiu em 1998, com outra publicação sua: “Brasil-Líbano – Amizade que desafia a distância”. O escritor percebeu como Dom Pedro II foi pioneiro em estreitar as relações entre o Brasil e o Mundo Árabe e começou a pesquisar sobre o assunto em cartas, documentos e no diário do imperador. O Mundo Árabe da época desconhecia o Brasil e a América Latina ou tinha imagem negativa da região, refletida pela Europa.
“Colocaram em jornais (europeus): ‘não vão para o Brasil, porque o que eles prometem, eles não cumprem’”, explicou Khatlab, ao ICArabe, em relação à imigração europeia. “Quando Dom Pedro II fez a viagem dele, foi quebrando essa imagem. Na verdade, foram fazendeiros que contrataram (e não cumpriram acordos com os imigrantes). Depois o Império criou uma lei que o que era prometido, tinha de ser cumprido. Se ia dar um terreno, tinha que dar”, disse. “Esse imperador do Brasil foi o pioneiro dessa relação. Atraiu esses imigrantes comerciantes, que fizeram o trabalho fabuloso de unir as regiões da vida de comércio de mascate”, destacou Khatlab.
O escritor também falou sobre o interesse cultural nas viagens de Dom Pedro, que viajou em caráter não oficial para não precisar cumprir rituais burocráticos, como ter de encontrar chefes de Estado. “Ele queria mostrar que estava aberto a todos. Estudou o hebraico, o árabe, lia o Alcorão. Há exemplares que ele trouxe na Biblioteca Nacional”, contou.
A palestra e as curiosidades contadas no livro encantaram os espectadores, como no caso do presidente da diretoria do Esporte Clube Sírio, Fabio Kadi. “O trabalho do Roberto é fruto de de bastante pesquisa . Aqui no clube há uma grande quantidade de pessoas que têm interesse na cultura árabe”, afirmou.
A professora de idiomas e tradutora, Mylene Boassaly, afirmou ter gostado de tudo que ouviu na palestra. “Tinha coisas que eu não sabia. Eu não sabia que os árabes vieram muito depois dele, ele que os trouxe.”
Já o advogado Roberto Achcar falou sobre a imagem revelada pelo trabalho de Khatlab: “É tudo muito curioso, essa faceta de um intelectual, poliglota. Na escola, a gente aprende o príncipe que foi colocado no poder cedo e depois aquele velhinho”, refletiu. Achkar também falou sobre curiosidades que descobriu na palestra. “Os árabes vinham com o passaporte otomano. É por isso que as pessoas chamam até hoje o árabe de turco”.
A palestra foi preparada pelo Núcleo de Cultura Árabe do Esporte Clube Sírio. Gabriel Bonduki, participante do núcleo e também diretor do ICArabe, falou sobre a metodologia de trabalho de Roberto Khatlab. “É um assunto bem interessante, ele fala de onde trouxe (as informações), que estão lá no Rio de Janeiro, no Museu Imperial de Petrópolis, como ele recolheu os documentos”, exemplificou.
Sineval Rodrigues, também membro do Instituto, elogiou o perfil viajante de Dom Pedro II. “Era um cidadão pesquisando. Tudo o que ele escreveu foi a respeito do que ele aprendeu nas viagens, sem a arrogância de ensinar ninguém. Essa postura, que eu desconhecia, ilustra bem a política que o Brasil deve continuar mantendo com esses países. Nós devemos aprender com essas pessoas”, refletiu.
Rodrigues também relacionou a cobertura da mídia brasileira da época com a atual. “Ele fez essas viagens com recursos próprios e trazendo riqueza de formação para o Brasil, inclusive essa experiência da produção de seda, da abertura para a imigração, e a imprensa nacional, já canalha na época, destratava-o e fazia piada dessas experiências”, afirmou.
Para o sócio do ICArabe, há um sentimento de “vira-latismo” na mídia. “Não conseguimos fazer nada de relevante porque somos vira-latas. “A imprensa queria reduzir a experiência a uma experiência fútil e o acusando de estar gastando recursos públicos”, criticou.