Debate no Cinemulher esquenta programação da 5ª Mostra Mundo Árabe
Na noite de sábado, 11 de setembro, ocorreu no Centro Cineclubista de São Paulo, na seção Cinemulher, a exibição do filme Dunia (Beije-me mas não nos olhos), de Jocelyn Saab, que foi seguida de um debate entre o público e as participantes convidadas Soraya Smaili, diretora Cultural e Científica do ICArabe, e Daniela Auad, professora da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e especialista em educação e relações de gênero. A atividade fez parte da programação da 5ª Mostra Mundo Árabe de Cinema e reuniu cerca de 50 pessoas que lotaram a sala em uma discussão acalorada até as 22h30.
A produção exibida conta a história de uma jovem estudante de Belas Artes, Dunia, que vive no Egito e sonha em ser uma bailarina profissional e poeta. Sua expressão artística é inibida, no entanto, por sua inabilidade em experienciar e expressar o desejo. Dunia acredita que uma mulher não pode mover o seu corpo de maneira sensual e é frequentemente estimulada a pensar e falar sobre isso pelo professor Dr. Beshir. O enredo do filme leva a uma viagem por uma sociedade cheia de contradições sobre a sexualidade.
Para dar início ao debate, Daniela comentou alguns pontos do filme. Segundo ela, a produção traz à tona a resistência feminina no Oriente Médio. “Muitas pessoas acham que a mulher árabe é submissa e passiva. O filme mostra que não é assim. Existem diversos movimentos feministas naqueles países e as mulheres resistem de diversas formas”, colou a professora. De acordo com sua interpretação, a personagem Dunia usava a dança para silenciar o próprio desejo. “E nós aqui no Ocidente, o que fazemos para lidar com nossos desejos, para silenciar os desejos proibidos?”, questionou. Ela lembrou que muitas mulheres ocidentais se submetem à tradição para se libertarem de determinadas situações. “Há mulheres que se casam apenas para saírem da casa dos pais, outras engravidam para entrar na vida adulta”, salientou. Daniela ressaltou ainda outro tema importante sobre o qual o filme trabalha que é a honra do homem guardada no corpo da mulher.
Em sua explanação, Soraya Smaili aproveitou para apresentar o Instituto da Cultura Árabe ao público. “Entre as funções da entidade está a de esclarecer visões distorcidas sobre o mundo árabe que são divulgadas no ocidente e a questão da mulher no Oriente Médio é uma delas”, afirmou. Ela explicou que a decisão de exibir o filme Dunia na Mostra foi tomada pela Casa Árabe da Espanha (Leia aqui o texto da Casa Árabe sobre a produção). No entanto, a diretora revelou que deve dúvida em exibir o filme em função de uma cena de castração feminina que aparece. “Fiquei com medo de as pessoas acharem que a prática ocorre em todos os países do mundo árabe e que está ligada ao Islã, o que não é verdade. Mas acabei optando por exibir, pois seria uma forma de debater a situação e elucidar informações falsas”, disse, ressaltando que a “circuncisão” de meninas é um costume tribal muito antigo, presente principalmente no continente africanos. “Esse filme presta um serviço de colocar questões complexas e estimular o debate. Acredito que muito do que é mostrado são temas universais das mulheres em todo o mundo e não só das mulheres árabes”, salientou.
A partir de colocações e perguntas da plateia, as duas convidadas puderam aprofundar os temas. Um deles foi a ideia equivocada de que a mulher muçulmana é mais oprimida do que a cristã. “O mundo árabe é muito diversificado e complexo. São 22 países, cada um tem uma religião predominante e com regimes diferentes, não podemos generalizar dessa maneira. Inclusive, no filme, não conseguimos saber qual é a religião da Dunia”, destacou Soraya.