Depoimento: Exclusão da mulher é vista com naturalidade nas sociedades
Sou de origem árabe e filha da primeira geração de migrantes. Posso dizer que, sobre o que as mulheres do século passado passaram, estamos, hoje, em outra situação. É evidente que essa situação pode ser considerada mais confortável, mas, o problema em relação à mulher é sempre o mesmo.
Independentemente da cultura - árabe, islâmica, judaica, católica ou budista -, a situação da mulher é a mesma. Há um entendimento de que a mulher é secundária e convive com a exclusão, como se fosse uma causa natural em relação ao gênero feminino. Portanto, neste 8 de março, não só para nós mulheres árabes, estamos reagindo contra o preconceito. Pinça-se uma situação em relação à mulher árabe e não se percebe o todo que uma mulher árabe e as mulheres, internacionalmente, enfrentam. Há uma discriminação cultural tremenda em relação à mulher árabe como se todas fossem violentadas, discriminadas, subjugadas e excluídas. Como se todas vivessem a mesma realidade que mulheres de determinadas tribos africanas vivem. Há uma responsabilidade da opinião publica internacional de romper com esse preconceito.
Vejo que fazemos o nosso papel aqui na sociedade brasileira, veja o número de mulheres que temos em situação de destaque, e como nós nos relacionamos com a sociedade brasileira. Temos uma relação de contribuição, construção e de combate a uma das maiores chagas em relação à mulher. No meu caso, trabalho há mais de 30 anos no combate à violência doméstica, hoje muito falada e discutida. Há programas do Estado brasileiro em relação à violência doméstica, porém, os dados são os mesmos. Veja o carnaval de 2017 e o número de mulheres que foram violentadas no Rio de Janeiro: em cada quatro minutos, uma mulher foi violentada. Um problema assim como a morte materna, a desigualdade salarial e a desigualdade em oportunidade em cargos de comando. E quando se discute a mulher na política, uma área em que trabalho há muitos anos, é uma tragédia. Os partidos ainda não se prepararam para receber as mulheres, seja o partido que for. Temos uma discriminação de gênero muito forte e essa luta não é só das mulheres árabes, é de qualquer mulher, seja branca, negra, africana, árabe ou não árabe. Não importa.
Quero me solidarizar e dizer a importância de o mundo perceber, hoje, as mulheres que estão refugiadas e em que condições vivem essas mulheres. Agora mesmo, alguma mulher, com a sua família e os seus filhos, deve estar peregrinando em busca de uma segurança para poder viver. O planeta tem uma responsabilidade muito maior do que ficar falando que a mulher árabe é submissa, é isso e aquilo. Tem que se dizer e se saber em que condições essas mulheres vivem e o porquê vivem.
A mídia desinforma ao invés de informar. A mídia não coloca a garra de uma mulher árabe, o afeto que uma mulher árabe trás, como cria os seus filhos e se relaciona com a sociedade e a comunidade. Não conhece a mulher árabe e a solidariedade da mulher árabe. Porque se há algo que faz diferença nos conflitos armados, é a solidariedade entre as mulheres, independente de elas serem árabes, judias, islâmicas ou católicas. Não importa: sendo mulher, uma pega na mão da outra e se liberta.
O dia de 8 de março é mais um dia de luta, mais um dia de combate e mais um dia de esperança. Espero que, em 2018, possamos estar dizendo que os números de violência, de desempregadas e de desigualdade salarial estão melhorando. Essa é a minha esperança e essa é a minha luta.
MUNA ZEYN é assistente social formada pela FMU e pós-graduada pela PUC. Desde o período universitário militante dos movimentos sociais em defesa da mulher, pelas políticas públicas de moradia, saúde e direitos sociais.