Prêmio Nobel da Paz vai para Quarteto do Diálogo Nacional da Tunísia
O comitê do Nobel justificou sua decisão citando a “contribuição decisiva [do Quarteto] à construção de uma democracia pluralista”.
O presidente em exercício do ICArabe, José Farhat, conversou com o Portal sobre a premiação ao Quarteto. Leia abaixo:
ICArabe - Como o senhor vê o reconhecimento do Prêmio Nobel da Paz, que acaba de ser anunciado para o Quarteto do Diálogo Nacional Tunisiano? Terá algum impacto para os países árabes?
José Farhat - Desde a premiação do ano passado, de 2014, o Comitê Nobel Norueguês vem preferindo organizações a indivíduos para a premiação. Isto não significa que não existam indivíduos que atuaram em favor da paz, mas o Quarteto do Diálogo Nacional tunisiano tem méritos que, ao serem premiados, encorajam outras organizações, em vários países, a imitarem estas organizações.
A homenagem ao Quarteto inclui os indivíduos que acenderam os fósforos da luta pela liberdade e pelo pão, tendo à frente e como símbolo a imolação de Muhammad Buazizi, no dia 17 de dezembro de 2010, que se estendeu por todo o ano seguinte de 2011, representando um tsunami colossal clamando por cidadania e dignidade, que provocaram manifestações populares massivas de erupção espontânea.
Muhammad Buazizi, um indivíduo portador de diploma universitário que não encontrava emprego, como milhões de outros tunisianos e outros cidadãos dos 22 países árabes, vendia verduras e legumes numa pequena banca em praça pública e foi submetido à humilhação e chicotadas da polícia de um governo islâmico fundamentalista influenciou organizações como o Quarteto recebedor do Prêmio Nobel de 2015.
Não esqueçamos que a UGTT – União Geral dos Trabalhadores Tunisianos, inspirado por Muhammad Buazizi, prendeu no palácio governamental da Tunísia todos os membros do governo que queria destruir as reivindicações do povo tunisiano e favorecer os seus ideais de conquista do poder retrógrado e os objetivos das grandes potencias internacionais dominadoras dos países árabes e condicionou sua liberação pela adoção de uma nova Constituição favorável àqueles que lutavam na Tunísia pela liberdade e pelo pão.
Só assim teve êxito o movimento que transformou a Tunísia num país dos tunisianos e um exemplo dos demais países árabes e seus semelhantes através do mundo.
O reconhecimento da luta vitoriosa do Quarteto tunisiano é uma homenagem ao povo lutador da Tunísia e um exemplo para os povos dos demais países árabes.
ICArabe - Este ano, personalidades individuais como o Papa Francisco e Angela Merkel foram desbancadas por um coletivo da sociedade civil. Qual o significado disto?
José Farhat - Papa Francisco e Angela Merkel, com suas ações meritórias em favor dos povos que sofrem devido às ambições e humilhações das grandes potências colonialistas, têm o mesmo mérito que Muhammad Buazizi, este como exemplo de luta e aqueles como partes de organizações que ajudam aqueles que lutam pelos mesmos objetivos.
ICArabe - As notícias sobre o Prêmio ressaltam, em sua maioria, que a Tunísia foi o único país bem sucedido na Primavera Árabe. O senhor acredita que os movimentos populares que se iniciaram como Primavera Árabe ainda poderão ter impactos positivos nos outros países?
José Farhat - De fato, a Tunísia foi o único país no qual o povo saiu vitorioso na luta da Primavera Árabe; foi uma vitória dupla: contra os partidos e movimentos fundamentalistas islâmicos internos e um triunfo contra as ambições dos países que lutam pela submissão de todos os povos da terra pela imposição de seus objetivos, a eles favoráveis e aos povos desfavoráveis.
É claro que o movimento da Primavera Árabe, uma vitória do antagonismo entre islamismo e secularismo, está em andamento em outros países árabes. Se tomarmos a Síria como exemplo, podemos considerar que a luta do povo sírio começou e continua acontecendo com inspiração na vitória na Tunísia da Primavera Árabe. Tanto isto é verdade que tudo se assemelha na Síria à Tunísia na fase inicial de luta: as potencias estrangeiras e os fundamentalistas islâmicos estão do mesmo lado, procurando fazer o que tentaram e não conseguiram na Tunísia: vencer aqueles que na Síria lutam pela liberdade e recusam viver sob a humilhação de ocupação estrangeira.
Crédito da foto: Foto de setembro de 2013 mostra o presidente da União Tunisiana da Indústria, do Comércio e do Artesanato (Utica), Wided Bouchamaoui, o secretário-geral da União Geral Tunisiana do Trabalho (UGTT), Houcine Abbassi, o presidente da Liga Tunisiana dos Direitos Humanos (LTDH), Abdessattar ben Moussa, e o presidente da Ordem Nacional dos Advogados da Tunísia (ONAT), Mohamed Fadhel Mahmoud, durante conferência em Túnis. O quarteto formado pelas quatro organizações após a revolução de 2011 na Tunísia ganhou o Nobel da Paz de 2015 (Foto: AFP)